Ricardo Kotscho
Ricardo Kotscho
Por falar em eleição direta, entre os muitos convites que tenho recebido
para dar depoimentos em documentários e vídeos acadêmicos sobre os mais
diferentes episódios da nossa história recente, quer dizer, de 20, 30, 40 anos
atrás, chegou-me o de Pedro Asbeg, um jovem diretor carioca, que eu não
conhecia.
Como o tema era um dos meus prediletos _ a luta pela redemocratização do
país na primeira metade da década de 80 do século passado _ topei logo e
marcamos a gravação para a tarde desta segunda-feira, dia 15.
Foi ótimo poder recordar aquele tempo de transição da ditadura para a
democracia, o país em ebulição, com tanta coisa boa acontecendo ao mesmo tempo
em todas as áreas da política, da cultura, da cidadania e até do futebol, com a
"Democracia Corintiana" de Sócrates, Casagrande e Vladimir, sob a
batuta de Adilson Monteiro Alves e do meu preclaro amigo Washington Olivetto.
O projeto inicial de Asbeg, formado em Cinema pela Westminster
University de Londres e filho de José Carlos Asbeg, diretor do documentário
"1958 _ O ano em que o mundo descobriu o Brasil", era fazer um
longa-metragem, com produção de Gustavo Gama Rodrigues, apenas sobre o futebol
no período.
No segundo semestre do ano passado, ele começou a recolher depoimentos
sobre a "Democracia Corintiana", mas o dinheiro da produção acabou.
Enquanto cuidava de captar recursos, teve a idéia de resgatar o período também
em outros campos da vida nacional, incluindo o grande movimento das
"Diretas Já" e o surgimento do Rock Brasil.
Em julho passado, Pedro Asbeg conseguiu juntar mais R$ 20.455,00 de 114
incentivadores (uma ninharia perto do que recebem pela Lei Rouanet artistas já
consagrados), e reiniciou as filmagens.
Em uma hora de entrevista, fiquei impressionado com o conhecimento
histórico do documentarista, algo pouco comum entre os jovens que vêm falar
comigo.
Dá gosto de conversar com quem domina o assunto e te instiga a refletir
sobre causas e consequências de um determinado tempo histórico. Afinal,
estávamos falando de fatos ocorridos mais de 30 anos atrás.
Embora a ditadura ainda não tivesse acabado, eram tempos mais simples de
se viver. Não havia esta geléia geral da crise de caráter e de valores que
atualmente assola o país.
Bandido era bandido e polícia era polícia, governo era governo e
oposição era oposição, são-paulino era são-paulino e corintiano era corintiano,
amigo era amigo e inimigo era inimigo.
Tempos da República do ABC, o grande centro da resistência democrática
formado em torno dos metalúrgicos comandados por Lula, berço do PT e da CUT,
tempos da luta pela Anistia e da volta dos anistiados, dos muitos movimentos
sociais reunidos logo adiante no que se convencionou chamar de Sociedade Civil,
tempos de lutar pela volta das eleições diretas para a Presidência da
República.
Além de Lula, surgiram nesta época novas lideranças de expressão
nacional como Fernando Henrique Cardoso, que participaria da fundação do PSDB _
e os dois juntos, um de cada vez, acabariam presidindo o Brasil nestes últimos
16 anos da nossa jovem democracia.
Eu era repórter da "Folha de S. Paulo" e,viajando pelo país de
ponta a ponta, pude ver tudo de perto, conhecer bem os personagens que
escreveriam nossa história no pós-ditadura:
Como
dizia o sábio que comandava o jornal, Octavio Frias de Oliveira: "Vivi o
suficiente para ver tudo acontecendo e o seu contrário".
Ricardo Kotscho
Que honra ouvir tudo isso de um cara como Ricardo Kotscho hein? Parabéns!
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